Um tanque ou lago pode agir como um espelho, uma armazenagem de calor, um limpador de poluentes, um sistema de transporte, uma barreira contra o fogo, um recurso de lazer, um banco de energia, parte de um sistema de irrigação ou simplesmente um criatório de peixes, crustáceos e plantas aquáticas. Além de tudo isso, é naturalmente paisagístico e produtivo.
Abaixo uma ilha de pneus para tanque de água fresca. (figura 01)
Sistemas de tanques, ou aqüiculturas, são muito mais produtivos e eficientes do que sistemas baseados em terra, devido ao constante suprimento de água e nutrientes, em uma forma facilmente assimilável, e de uma variedade de plantas e animais que podem servir de alimentação ou serem vendidos. Uma mistura de peixes, lagostins, moluscos, pássaros aquáticos, plantas de margem e até animais de terra, cercados, leva vantagem sobre os diferentes nichos de alimentos do sistema.
A maioria dos livros trata a aqüicultura como piscicultura, mas existem tantas plantas úteis para serem plantadas na água quanto existem peixes; muitas algas, moluscos e, até mesmo, insetos comestíveis e rãs podem ser considerados. Nós podemos projetar o sistema para considerarmos em nossa produção principal qualquer um dos seguintes itens: peixes, castanhas d’água, arroz silvestre, mel de lupelo de pântano, peixe para iscas, mariscos e lesmas de água doce, peixes de aquários, flores aquáticas, camarões, ovas de peixe, juncos ou chorões para artesanato, fungos desenvolvendo em paus podres etc. Todos eles são “aqüiculturas”. É melhor suprir um mercado especialista menor e confiável – plantar alga vermelha para caroteno, por exemplo, do que penetrar em um mercado enorme de trutas alimentadas com ração ou outras iniciativas altamente capitalizadas.
Estas informações descritas aqui darão apenas algumas idéias para o produtor em pequena escala ou para a produção caseira. É importante reconhecer que, quanto mais intensivo o sistema, mais necessitará de pesquisa, planejamento cuidadoso e manejo adequado.
Construção de açudes
Antes da construção de açudes ou tanques para aqüicultura, deve-se planejar a incorporação de ilhas e refúgios para pássaros aquáticos, margens rasas no interior para plantas forrageiras e um refúgio profundo para peixes, em áreas onde as temperaturas de verão sejam altas. Além disso, refúgios submersos, como pneus velhos, canos de barro e troncos ocos protegem as espécies menores dos peixes e pássaros predadores.
A estabilização dos bancos dos açudes é feita com troncos, pneus ou degraus cortados e plantados, utilizando bambu, capim pampas ou outras espécies de raízes superficiais. Embora arbustos possam ser plantados, a estrutura de raízes de grandes espécies de árvores poderá danificar os bancos, eventualmente.
Quando da construção de um novo açude ou tanque para aqüicultura de peixe , não introduza peixes imediatamente. Novos açudes não têm a habilidade de açudes bem estabelecidos para prover uma variedade de alimentos naturais. Depois de o açude ter sido cheio pela primeira vez, coloque de 5 a 10 cm de palha à volta da linha d’água e caminhe por cima para introduzi-la no solo molhado. Isso minimizará a erosão do solo, oferecendo cobertura e uma fonte de alimentos para os pequenos insetos aquáticos. Plantas aquáticas como o lírio, a taboa, a castanha d’água e, até mesmo, um pequeno número de ervas aquáticas, também ajudam nesse processo.
Novos açudes são, algumas vezes, barrentos e podem necessitar de uma aplicação de calcário (adicionado a uma razão de 560 kg/ha). Reduza a quantidade de lodo penetrando no açude a partir da entrada, cobrindo com capins o dreno ou encosta imediatamente superior do açude. O manejo cuidadoso da área de captação (plantando vegetação, dirigindo o fluxo d’água) é crítico para evitar o assoreamento completo do açude.
Uma ilha é construída dentro do novo açude, simplesmente, empurrando terra em um grande monte e cobrindo com solo; alternativamente, pneus são arranjados em uma pilha e cheios de terra (figura 01).
Animais devem ser certados fora dos açudes de aqüicultura; eles tornam a água barrenta, destroem a vegetação e podem causar sérios problemas de erosão.
Profundidade e forma do açude
O número de peixes que pode ser introduzido em um açude é reativo à área de superfície, não a sua profundidade ou ao volume. A área de superfície controla a quantidade de alimento dentro e á volta da água. Todavia, a profundidade também é importante para que os peixes possam escapar para o fundo, resfriarem-se em tempo quente e evitarem pássaros e outros predadores. Um número comum é de 2 a 2,5 metros de profundidade. As configurações seguintes são utilizadas regularmente, em todo o mundo.
Abaixo esquema de configurações para tanques. (figura 02)
Açudes em série: Peixes de idades diferentes podem ser seqüenciados no curso, em um estilo linha de montagem (figura 02). Dessa forma, o alimento é fornecido ao peixe em uma “escada trófica” de tanques rasos próximos à pântanos, a qual oferece um excesso contínuo de alimento vivo para os açudes principais, ainda que estejam isolados seguramente dos predadores, para que os organismos de reprodução rápida possam habitar livremente. Como a alimentação é responsável por 70 a 90% dos custos, torna-se bem mais barato produzi-la do que comprá-la.
Tal arranjo tem a desvantagem de que qualquer parasita, doença ou poluente irá fluir para todos os açudes; embora isso não seja comum em operações pequenas, é um risco que deve ser considerado.
Açudes em paralelo: Cada açude pode ser isolado de doenças e, também aqui, um açude com espécies para alimento pode ser instalado acima de casa açude de produção (figura 02). Note que “espécies alimento” podem, elas mesmas, ser escolhidas para ser diretamente comestíveis ou para uso como iscas. Em geral, açudes em paralelo são controlados, drenados e manejados mais facilmente do que açudes em série.
Açudes canalizados: Estes são especificamente, próprios para peixes que dependam da alimentação nas margens (carpa-capim, tilápia) ou de terra (trutas). Algumas das pisciculturas mais produtivas conhecidas são aquelas de canais de fluxo lento com estoque alimentar amplo ao longo destes (algumas fazendas de trutas, na Suíça, são, virtualmente, canais em curvas de nível em encostas argilosas íngremes). É geralmente mais fácil apanhar peixes em canais do que em açudes grandes, de formas variadas (figura 02).
A localização ideal e a forma do açude podem ser de canais construídos através de um pântano onde espécies de alimento se multipliquem, de forma que os canais sejam 20 – 30% do total da área de pântano. Os canais são estocados com peixes predadores, que exploram o pântano à procura de crustáceos e pequenos peixes. A retirada dos peixes ocorre quando a área de pântano adjacente está baixa, digamos, na estação de verão seco.
Tamanho do açude
Não necessitamos pensar que culturas de açudes são próprias somente para açudes-padrões, de ¼ de hectare. Aqui estão alguns produtos úteis para pequenos ou grandes açudes.
- 1 – 2 metros quadrados: agrião, inhame, castanha d’água chinesa e algumas rãs para controle de pragas de jardim; um lírio raro, uma pequena população de peixes raros ou plantas de aquário;
- 5 – 50 metros quadrados: uma grande variedade de plantas alimentícias e, em tamanhos maiores, peixes selecionados cuidadosamente, suficientes para uma família;
- 50-200 metros quadrados: cultura comercial especializada, estoque de reprodução, plantas de alto valor e suprimento completo de proteína para uma família, comportando um bando de patos;
- 200 – 2000 metros quadrados e maiores: comercial para peixes de alto valor e crustáceos; tamanhos maiores permitem uso recreativo.(Note que, a cada aumento de tamanho, todos os usos de tamanhos menores estão incluídos).
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Policultura benéfica ou consórcio
Embora um sistema de aqüicultura deva ser projetado com uma proposta principal (um peixe em particular, crustáceo ou planta aquática), é importante combinar uma variedade de espécies aquáticas benéficas, para preencher os nichos disponíveis ou para subsidiar o produto primário. As classes amplas de organismos aquáticos são as seguintes:
Alguns elementos de uma policultura de lagoa
- plantas, desde os arbustos de margem até a vegetação submersa e o fitoplâncton;
- invertebrados, microorganismos e crustáceos;
- peixes, desde os forrageiros e até as plantas, moluscos e espécies predatórias; até seis espécies de peixes cuidadosamente selecionados podem ocupar um açude de forma lucrativa e aumentar a produção;
- aves aquáticas, especialmente os patos, os gansos e, até, os pombos, com casas sobre o açude.
Plantas associadas com açudes são:
- espécies de raiz comestível, como o inhame, o lírio d’água, o lótus e a castanha d’água, plantados submersos nos bancos ou no fundo, possivelmente cercados por um pneu velho, para marcar a localização;
- aquáticas flutuantes como kang kong, agrião e aquáticas carpete como Azolla e lentilha d’água (Lemna) poderão cobrir todo o açude, ainda que possam ser arrastadas e comidas pelos animais (patos adoram) ou utilizadas como mulch em jardins ou cercando as plantas de margens;
- plantas de margem rasa alagada, de haste longa, Typha (taboa) ou arroz silvestre, como refúgio para rãs e pássaros;
- plantas de margem úmida como o bambu, mamão, banana, confrei, Sambuccus esp. e uma cobertura verde curta de capim ou Desmodium (uma espécie invasora); essa cobertura mantém os bancos estáveis e verdes, sendo uma fonte de forragem para patos e gansos.
Para animais aquáticos, uma variedade de alimentos de níveis diferentes é muito útil. Comedores de fundo de açude alimentam-se de detritos filtrantes ou alimentadores e do zooplâncton, enquanto que comedores de superfície são herbívoros, comento algas e capins. Vagando pelos sistema estão os predadores de nível intermediário.
Comedores de detritos são mariscos e mexilhões de água doce, que vivem no lodo, no fundo do açude. Eles podem filtrar até 900 litros de água poluída por dia, por meio de seus sistemas, e ejetar soluções concentradas (geralmente, fósforo) no lodo, as quais podem ser utilizadas como fertilizantes em pomares ou lavouras, quando os açudes são drenados. Outros comedores de fundo (plâncton) são crustáceos, caranguejos e lagostins.
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Na foto abaixo algumas espécies criadas no sistema de consórcio com patos no açude do Sítio Curupira.
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Peixes herbívoros são aqueles que como a carpa-capim, podem limpar a vegetação da margem de um açude. São peixes de crescimento rápido e alcançam um tamanho para o mercado em 3 meses, com um suprimento adequado de alimento. No Havaí os açudes são estocados com camarões de água doce como produção principal, como uma produção secundária de carpas-capim comendo o capim quicuiu das margens. Patos fornecem nutrientes para os açudes (patos e peixes são uma combinação excelente, de alta produção).
Peixes predadores (truta, traíra e dourado) são aqueles que se alimentam de outros peixes e em uma policultura complexa, são confinados do resto das espécies no açude. Pequenos peixes e crustáceos entram na área cercada e são devorados. Tais áreas cercadas podem ser usadas para:
- alimentação e aeração de emergência; isso é usado para muçus, por exemplo, economizando energia naquelas poucas noites de verão em eu a aeração do açude inteiro se tornaria cara;
- que, nos açudes menores, peixes predadores de alto valor possam ser mantidos para eliminarem os peixes de tamanho insuficiente dos açudes maiores, que por meio de uma separação de tela que permita a esses peixes nanicos penetrarem na área;
- que as seções de açudes menores possam reproduzir camarões minou para peixes maiores, no açude principal. De acordo com Swingle, 30% de qualquer açude poderia ser cercado para peixes forrageiros e camarões; nutrientes são adicionados a essa parte do açude, onde os camarões rapidamente se multiplicam.
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Qualidade da água e fertilização do açude
Quando montar um consórcio de espécies para o açude, as considerações primárias serão quanto aos estercos (fertilizantes) para o sistema; alimento para os outros organismos; a moderação do clima do açude (vegetação das bordas) e a melhoria da qualidade da água, especialmente em relação à utilização dos detritos e ao uso completo dos alimentos.
Água de boa qualidade, com pH de 7 a 8, é a melhor. Se a água for muito acida, os nutrientes do solo serão ligados e não poderão ser liberados para dentro dela. É comum o fundo dos açudes se acidificarem eventualmente; embora possa-se adicionar calcário na superfície, o açude pode ser drenado em intervalos do poucos anos. Muitos produtores do sudeste da Ásia realizam culturas no fundo de açudes fertilizados por patos e, então, enchem-nos novamente para outro ciclo de produção de peixes, após a adição do calcário. Ciclos de culturas secas podem ser utilizados nos açudes a cada período de 2 a 4 anos, para aproveitar os níveis geralmente altos de nutrientes no fundo do açude, para um plantio de alto valor, como melões ou grãos de “luxo”, como o arroz silvestre.
Abaixo vemos um desenho (figura 03) de consórcios amplamente utilizados na Ásia, onde estercos de animais são utilizados para fertilizar os tanques. Isto é facilmente alcançado se os abrigos são localizados sobre o tanque. Pisos devem ser gradeados para que o esterco caia na água.
A fertilização do açude é um fator chave no aumento da produção e poderá vir de animais da terra, folhas caídas e outras vegetações. Estercos adicionados aos açudes aumentam o crescimento das plantas, e o zooplâncton se multiplica, o que, na seqüência, aumenta a disponibilidade de alimento. Pássaros aquáticos no açude, peixes herbívoros alimentam-se nas margens e animais terrestres habitando acima da água ou ao longo do canal direcionado ao açude contribuem com esterco valioso para a água. (figura 03). Camarões em particular, utilizam, rapidamente esterco de outras espécies; camarões alimentados com esterco da carpa-capim crescerão tão bem quanto alimentados com esterco de galinha, pois comem algas e/ou diátomos produzidos na superfície do esterco.
Plantas aquáticas flutuantes (confinadas em anéis) e canteiros aquáticos nas bordas ajudam a remover ou a reciclar os nutrientes do açude para plantios de terra, pela utilização dessas plantas como mulch ou composto. Depois de os peixes terem sido pescados , a água, rica em nutrientes do açude, poderá ser utilizada para irrigação por gortejamento em um plantio terrestre, resultando na produção, em dobro, de folhas e frutos.
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Em açudes estocados densamente, ou ricos em nutrientes, a água de ser arejada durante os dias quentes, ou os peixes morrerão. Bombas de pás são normalmente utilizadas para o arejamento em açudes comerciais, os quais são cuidadosamente monitoradas durante os períodos críticos. Todavia em açude, de forma que o arejamento mecânico não seja necessário. A altura e a forma das árvores próximas poderão prover sombra em tempo quente. Bordas de chorões poderão economizar o custo do arejamento e prover folhas para minhocários.
A qualidade da água e a remoção dos detritos (fezes de peixes e outras) é melhor alcançada pela inclusão de decompositores, em particular, mariscos de água doce e comedores de algas superficiais (Vivípara sp.), como, também, carpa, bagre e camarões.
O efeito da adubação no viveiro
1 - Os patos adubam o viveiro continuamente;
2 – O esterco de gado, galinha ou porco, também podem ser lançados no viveiro para aumento da produtividade natural;
3 – As bactérias decompõem a matéria orgânica liberando dióxido de carbono (CO2) e outras substâncias que são aproveitadas principalmente pelas algas;
4 - As algas (fitoplâncton) que sintetizam substâncias orgânicas vivas, principalmente proteínas, a partir de substâncias liberadas na água;
5 - Zooplâncton que se alimentam de bactérias e fitoplâncton;
6 - Carpa Prateada que se alimenta (filtra) de algas do viveiro;
7 - Carpa Cabeça-grande que se alimenta de algas maiores e zooplâncton;
8 – Seres mortos que se sedimentam no fundo;
9 – Pequenos animais e insetos aquáticos que se alimentam destes sedimentos;
10 - Carpa Comum que se alimentam destes seres do fundo.
Alimentando os Peixes
Açudes deveriam ser projetados como sistemas autoforrageiros, para minimizar o trabalho. Alimentos podem ser obtidos, indiretamente, com esterco de patos, plantando vegetação de bordas nas quais os insetos de alimentam; por exemplo, a larva do bicho-da-seda alimenta-se das folhas da amoreira pode se sacudida ocasionalmente para dentro do açude; armadilhas para insetos podem ser colocadas na superfície da água. O plantio de espécies atrativas para cascudos e marimbondos e as coberturas “corrediças”, como Tradescantia, alfafa e confrei, entre outras plantas nutritivas, também ajudam na alimentação de peixes.
Métodos de alimentação direta incluem as culturas de minhocas e insetos (larvas) de alto valor protéico em canteiros especiais, ou armadilhas de insetos no pomar ou na horta, para prover alimento aos peixes. Podemos capturar ou criar gafanhotos, larvas de moscas ou, mesmo, iscas de peixes, girinos ou camarões em tanques menores. Bóias ou anéis de rede no próprio açude podem ser adicionados para uma cultura especial de alimento para peixes – minhocas reproduzem-se tão bem em bóias quanto em terra.
Além da alimentação com insetos, grãos de alto teor de carboidratos (ex.: sorgo, restos de arroz, cascas, etc.) são suplementares para o alimento protéico e produzidos no local, utilizando a água rica em nutrientes do açude.
Estoques
Animais livres de doenças devem ser adicionados aos açudes desde o princípio; então, compre-os, se possível, de uma fonte de boa reputação.
Somente à medida em que os peixes forem crescendo até um peso ideal, são utilizadas, completamente, as fontes de alimento; assim, iscas e camarões de crescimento rápido podem utilizar estes alimentos e armazená-los em seus corpos (em forma de crescimento), para uso posterior pelos predadores.
À medida em que aumentamos o número de peixes por unidade de área, o tamanho para a coleta diminui. Poucos peixes de tamanho grande, ou muitos peixes pequenos, demonstram açudes subestocados ou superestocados, respectivamente, sendo a subestocagem o erro mais comum. O objetivo não é, somente, o de otimizar a produção, como, também, o de ter peixes e plantas de tamanho útil. Peixes e plantas muito amadurecidos consomem e não crescem na eficiência máxima.
Bibliografia:
- Introdução à Permacultura – Bill Mollison e Reny Mia Slay
- Permacultura UM – Bill Mollison e David Holmgrem
- Manual de Pscicultura – Elek Woynarovich